Compartilhar
Muitas vezes, um vinho de sobremesa acaba sendo ignorado por diversos enófilos, mas este estilo encantador merece um capítulo à parte e por isso vamos apresentar um pouco mais sobre eles.
De onde vem seu dulçor?
Antes de tudo, é importante entender o que torna um vinho de sobremesa doce. Geralmente, a origem do sabor doce de um vinho provém da glicose e da frutose, que são açúcares naturais presentes no mosto e pararam de ser transformados em álcool e gás carbônico, permanecendo de forma residual na composição final da bebida.
Essa quantidade de açúcar residual pode variar de leve doçura, pouco mais de 5 g/l no caso de um vinho seco, até chegar no de sobremesa, passando 250 g/l.
Embora tenha um alto grau de doçura – e até mesmo um teor alcoólico mais elevado em certos estilos – um vinho de sobremesa apresenta também uma acidez marcante, o que promove um belo equilíbrio entre esses componentes. Caso contrário, teríamos na taça uma bebida pesada e cansativa, aquilo de chamamos de um vinho chato.
Técnicas para elaboração de vinho de sobremesa
Existem diferentes técnicas para alcançar um teor de açúcar residual maior, contudo, a adição de açúcares de outras fontes que não são da uva, não é uma delas. Neste caso, produz-se o conhecido vinho suave.
Entre os tipos mais comuns, podemos citar os vinhos fortificados, botritizados, de colheita tardia, de gelo (icewine) e de uvas secas.
Vinho fortificado
O processo inicial para se produzir um vinho fortificado é o mesmo de um vinho seco. A grande diferença está na adição de aguardente vínica antes de todo açúcar ser consumido pelas leveduras, interrompendo assim a fermentação alcoólica.
Dessa forma, o nível de açúcar se mantém alto, bem como o teor alcoólico. É um processo bastante utilizado em Portugal, Espanha e Itália. Entre os mais conhecidos, podemos citar: vinho do Porto, Madeira, Marsala, Moscatel de Setúbal e Jerez.
Vinho botritizado
Esse vinho de sobremesa é resultante do ataque do fungo Botrytis cinerea, que faz microfuros na casca da uva, provocando a evaporação da água e concentrando os ácidos e açúcares. Também conhecida como “podridão nobre”, essa infestação fúngica, ao contrário do que possa parecer, irá originar um vinho muito complexo, com aromas e sabores incríveis. Os mais conhecidos são Sauternes (França) e Tokaji (Hungria).
Importante citar que nem todas as uvas são suscetíveis à podridão nobre e nem todas as regiões conseguem proporcionar as condições ideais para que isso ocorra. Habitualmente, quando o fungo ataca, ele provoca a “podridão cinzenta”, que neste caso é uma doença e, dependendo do grau, pode levar a perda de uma safra inteira.
Para que a podridão deixe de ser cinzenta e se torne a tão almejada nobre, são necessárias condições muito específicas: manhãs frias e úmidas, e tardes quentes e secas. Dessa forma, a Botrytis ataca as bagas, mas não a ponto de estragá-las, pois a vinha é capaz de combater seu alastramento.
Entre as uvas que lidam bem com esse fungo podemos citar a Riesling, Furmint, Gewürztraminer, Sémillon, Pinot Gris e Chenin Blanc.
Vinho de colheita tardia
As uvas de colheita tardia, como o próprio nome sugere, permanecem na videira muitos dias após o período ideal de maturação para preservarem um teor de açúcar mais alto. É um processo bastante utilizado em países do Novo Mundo.
Outros termos para colheita tardia, comuns de se encontrar nos rótulos das garrafas, são Late Harvest e Cosecha Tardia.
Vinho de gelo
Esse vinho de sobremesa elaborado com uvas congeladas, também conhecido como icewine, vem de regiões muito frias e que possuem características específicas apropriadas para o congelamento das bagas antes que apodreçam na videira. Dessa forma, os açúcares da uva não congelam, somente a água, tornando o mosto concentrado.
Os icewines naturais necessitam de temperaturas rigorosas e devem ocorrer um tempo depois das uvas amadurecerem. Se o congelamento não for rápido o suficiente, as uvas podem apodrecer; ao passo que se for muito severo, talvez não consiga extrair o mosto.
Os países mais suscetíveis a produzirem vinho de gelo são o Canadá e a Alemanha.
Vinho de uvas secas
Neste estilo de vinho de sobremesa, colhe-se as uvas no período de maturação normal e depois elas vão para a secagem até perderem 70% de volume de água. O propósito é alcançar um nível mais alto de açúcar e também maior concentração de aromas e sabores.
No processo de secagem, os cachos são levados para salas arejadas e colocados em suportes de madeira onde podem ficar até 120 dias após a colheita. As uvas ficam sujeitas às condições climáticas variadas, como calor, vento e variações de temperatura e, dessa forma, adquirem características particulares que irão produzir grandes vinhos como os italianos Passito, Amarone e Recioto.
Harmonização com vinho de sobremesa
Quando se fala em harmonização de vinho de sobremesa, talvez a principal dúvida seja por onde começar.
O primeiro passo é pensar na consistência do prato e do vinho – para este, falamos do corpo. Para receitas doces sutis e leves, opte por um vinho de sobremesa também delicado. Porém, se o prato for robusto, à base de leite e ovos, por exemplo, o vinho precisa ter mais estrutura. O importante é eles serem proporcionais.

Quanto ao nível de doçura, o vinho deve ser igual ou mais doce que a sobremesa, mas seus sabores devem ser complementares ao do prato. E para não dar a sensação de muita doçura, o segredo é servir a bebida em temperaturas mais baixas.
E aqui vai outro truque: nem sempre um vinho de sobremesa precisa ser servido ao lado de um doce. É o caso da harmonização por contraste. Queijos mais fortes, salgados e de textura cremosa, como os queijos azuis (gorgonzola, roquefort), se destacam ainda mais com um Colheita Tardia ou Sauternes. Para estes, além da doçura, o foco é na acidez que irá equilibrar a textura, dando a estrutura necessária para a combinação perfeita.
Dicas extras
Para doces à base de frutas, como tortas, saladas de frutas ou até mesmo cheescake, opte por um vinho de sobremesa leve, com o mesmo teor de açúcar e, até mesmo, notas cítricas, caso de um moscatel.
Já para receitas de chocolate, aposte em vinhos encorpados e de sabor marcante, como o vinho do Porto. Pudins, manjares e outras receitas à base de leite e ovos, de texturas aveludadas, invista em vinhos de colheita tardia.
Se a sobremesa tiver doce de leite como ingrediente principal, procure combinar com uma opção de maior acidez para quebrar a doçura, como o icewine.
(Foto: Unsplash)
LEIA TAMBÉM